Por Mariana Claudino
“Águas que movem moinhos
São as mesmas águas que encharcam o chão
E sempre voltam humildes
Pro fundo da terra”
Esse é um trecho da música “Planeta água”, lançada por Guilherme Arantes há exatos 40 anos. Será que ele sabia o que nos esperava em termos climáticos e alimentares nos dias de hoje? A questão da água é urgente e precisa ser lembrada, debatida, conversada. Tanto que, este ano, o Dia Mundial da Alimentação, que é celebrado no próximo dia 16, tem como tema “Água é vida, água é alimento. Não deixar ninguém para trás”.
E sabem o porquê da urgência em falar sobre isso? Se o ritmo atual de consumo se mantiver, segundo dados da ONU e do French Institute for Demographic Studies, em 2050 nós vamos precisar de 60% a mais de comida, 50% a mais de energia e 40% a mais de água! De toda a água existente no planeta, 97,5% equivalem a água salgada e, portanto, apenas 2,5% representam a água doce. De acordo com o Instituto Akatu, é mais ou menos como se toda a água do planeta estivesse concentrada em 42 mil gotas dentro de uma garrafa pet de dois litros e apenas três fossem água doce. Mostrar isso para as crianças é uma forma de conscientizá-las, desde cedo.
Só que a maior parte dessa água doce é indisponível para o consumo humano, já que está na forma de gelo ou de cobertura de neve permanente nos polos e regiões montanhosas, ou como águas subterrâneas em lençóis freáticos. Assim, da quantidade total de água doce aqui na Terra, apenas 0,26% está disponível para atender nossas necessidades vitais.
A conscientização global sobre gerir a água de modo sensato é fundamental, uma vez que o rápido crescimento populacional, o desenvolvimento econômico (como a poluição da água com a extração de petróleo na Bacia Amazônica), a urbanização, a privatização da água e as alterações climáticas ameaçam a disponibilidade desse elemento tão precioso.
Água é alimento e hidrata, principalmente em um país tropical como o nosso. Mas as questões alimentares e ambientais caminham juntas: as ondas de calor que elevaram as temperaturas das cidades brasileiras em setembro levantaram o debate sobre o avanço das mudanças climáticas e seus impactos. Em todo o país, a atividade mineradora é uma das principais responsáveis pela emissão de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento global. E segundo a Universidade Federal de Juiz de Fora (IFJF), aqui no Brasil a ação das mineradoras ainda ganha outro destaque: seu potencial de desmatamento. Os dados são cada vez mais alarmantes e mostram que, em 2040, não haverá praticamente água potável em quase toda a Índia. Lá, a cada dia morrem em torno de 500 crianças devido a doenças decorrentes de água imprópria para consumo. Este problema está mais próximo do que a gente imagina: o podcast “O uso político da água no Brasil” mostra a realidade de moradores do interior de Alagoas, que deixam de comprar comida para comprar água, já que precisariam andar por duas horas até chegar à fonte mais próxima, uma vez que não têm cisterna em casa.
O que comemos – e como comemos – interfere na qualidade e na disponibilidade de água. Tanto o Guia Alimentar para a População Brasileira (Brasil, 2014) quanto o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras menores de dois anos (Brasil, 2019) chamam a atenção para a importância da água própria e o acesso à água potável para a nossa saúde. E, mais do que isso, para a nossa existência. Afinal, água é comida e deve fazer parte do hábito alimentar desde o início da oferta de outros alimentos. Podemos contribuir para essa realidade através de pequenos gestos (que juntos se tornam gigantes), entre eles escolher produtos locais, sazonais e frescos, desperdiçando menos, encontrando formas seguras de consumi-los e evitando a contaminação das águas.
A data do Dia Mundial da Alimentação foi escolhida para lembrar a criação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), em 1945. A primeira comemoração ocorreu em 1981 e a ideia é promover a iniciativa global dedicada a aumentar a conscientização sobre a importância dos sistemas alimentares sustentáveis e ao combate da fome do mundo. A FAO promove essa data através de uma ação coletiva entre 150 países em todo o mundo e em 50 línguas, sendo esse um dos dias mais celebrados no calendário da ONU. Por isso, é importante refletir: a água é essencial para a vida na Terra, mas a água doce não é infinita e é preciso garantir que ninguém seja deixado para trás no acesso a esse alimento e bem tão necessário. E você, o que está fazendo para contribuir?
*Mariana Claudino é jornalista, nutricionista infantil, pós-graduada em Comportamento Alimentar, co-fundadora do movimento Põe no Rótulo, membro da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, ex-aluna e mãe da EDEM e integrante do Departamento de Comunicação da escola.